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    Blog do Empreendedor

As mudanças no setor financeiro trouxeram mais praticidade, comodidade e rapidez para nossas transações. Com a ajuda da tecnologia e dos aplicativos, não é mais necessário sair de casa para fazer uma transferência bancária, por exemplo. Tudo pode ser feito digitalmente. Contudo, na mesma velocidade, surgiram golpes cada vez mais eficazes que geram prejuízos aos consumidores.

O artista plástico Jonatas Teixeira, 40 anos, de Cajamar (SP), é um dos milhares de brasileiros prejudicados. Em 2019, pouco depois de ter anunciado seu carro em um site de vendas, um homem entrou em contato dizendo que havia ocorrido um problema no cadastro do automóvel e que precisava confirmar algumas informações para dar prosseguimento ao anúncio. Em menos de cinco minutos o WhatsApp de Teixeira havia sido clonado. "Ele pediu para eu fazer mil coisas ao mesmo tempo. Então, quando solicitou um número de verificação enviado por SMS, eu o forneci sem ver o que era. Só depois que me toquei que era o código de autenticação do app", conta. Com esse código, o golpista conseguiu conectar a conta em um novo celular e desconectá-lo do WhatsApp. Então, começou a utilizar o aplicativo como se fosse o artista plástico, pedindo dinheiro para as pessoas que estavam em sua lista de contatos. O golpe só terminou quando sua esposa recebeu uma mensagem de um amigo questionando se estava tudo bem. Imediatamente, ela avisou amigos e familiares, porém, alguns já tinham transferido valores altos.

Casos como o de Teixeira são comuns. De acordo com especialistas, os bandidos utilizam a chamada "engenharia social", ou seja, os golpes são realizados de forma que a situação pareça real, iludindo a vítima. Um levantamento realizado na América Latina pela empresa de cibersegurança Kaspersky constatou que o Brasil é o principal alvo de golpes. Até agosto deste ano, cerca de 5 milhões de tentativas de ciberataques foram registradas, incluindo as praticadas no WhatsApp.

Como se prevenir?

Nunca compartilhe o código de verificação do WhatsApp, que possui seis dígitos e é enviado por SMS, nem com amigos nem com familiares. Este código é como se fosse uma senha temporária;

Desconfie. Caso receba uma mensagem de alguém pedindo dinheiro ou ajuda para resolver um problema relacionado a um anúncio online, por exemplo, entre em contato por chamada de voz, vídeo ou e-mail para confirmar a autenticidade do pedido;

Ative a confirmação em duas etapas no WhatsApp. Para ativá-la, entre em Configurações/Ajustes > Conta > Confirmação em duas etapas > ATIVAR. Em seguida, defina uma senha e digite seu e-mail;

Proteja a sua foto para que não seja copiada e usada de modo fraudulento. Deixe que apenas os seus contatos a vejam. Para alterar essa configuração, entre em Configurações/Ajustes > Conta > Privacidade > Foto do perfil > Meus contatos;

Caso o seu celular tenha a funcionalidade de impressão digital, ative o bloqueio instantâneo para evitar que seu WhatsApp seja acessado se seu celular for roubado. Para alterar essa configuração, entre em Configurações/Ajustes > Conta > Privacidade > Bloqueio por impressão digital/Solicitar o touch ID;

Ao escanear o QR code para transações por Pix, confirme sempre o valor e o nome de quem receberá o depósito. Isso evitará transferências para contas erradas, principalmente se o QR code foi adulterado;

Nunca passe a senha que usa em seu banco para ninguém. Não a confunda com a chave Pix, que pode ser o seu CPF, telefone ou email;

Faça transferências Pix usando sua rede de internet privada. O uso de Wi-fi aberto, de estabelecimentos públicos, pode ser a porta de entrada para vírus no seu telefone.

A analista de sistemas Antonella Souza*, 50 anos, de Cotia (SP), é outra vítima. Em agosto, sua mãe recebeu uma mensagem pelo WhatsApp de alguém se passando por ela. O recado dizia que ela havia mudado de número, que sua internet estava ruim e precisava que realizasse um PIX para sua conta. A mãe até desconfiou e tentou ligar para a filha, mas ela não atendeu. Como a foto utilizada no aplicativo era a de Antonella, ela fez a transferência de quase R$ 3 mil. O fraudador não desistiu e pediu mais R$ 2 mil. Mas, felizmente, Souza ligou para a mãe antes de ela fazer um novo depósito, impedindo, assim, um prejuízo maior. "Eu salvei o contato na minha agenda e fiquei acompanhando, a foto muda o tempo todo, são muitas vítimas", ela comenta.

Responsabilidade do banco

A mãe de Souza foi até o banco para informar sobre a fraude, mas até agora o dinheiro não foi devolvido. Ela fez bem, pois em situações de fraude bancária, as instituições financeiras têm responsabilidade objetiva, ou seja, são responsáveis independentemente de culpa, segundo o artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor (CDC).

Bárbara Simão, advogada e coordenadora da área de Privacidade e Vigilância no InternetLab diz que os golpistas utilizam contas de laranjas ou terceiros para receber o dinheiro, dificultando a rastreabilidade da transação. "Rastear a transação envolve um trabalho de inteligência e é responsabilidade dos bancos fazer isso, porque eles têm mecanismos para evitar que uma pessoa crie uma conta de maneira fraudulenta", afirma a advogada. Os bancos também são responsáveis por criar meios que garantam o acesso seguro do consumidor aos serviços bancários, o que inclui evitar golpes e fraudes. Para Ione Amorim, economista e coordenadora do programa de Serviços Financeiros do Idec, é imprescindível que a vítima registre a reclamação também no banco do fraudador e no Banco Central (BC), como forma de impedir que outras fraudes aconteçam. "Quando o consumidor reclama, os bancos colocam essas contas num diretório de contas suspeitas, o que ajuda a evitar que outras pessoas sejam vítimas", ela informa.

E o WhatsApp, tem culpa?

Segundo Camila Leite, advogada e pesquisadora do programa de Telecomunicações e Direitos Digitais do Idec, pelo CDC, o WhatsApp também pode ser responsabilizado. Com a ocorrência constante de fraudes aplicadas nessa plataforma, pode-se considerar que o serviço é defeituoso por não fornecer a segurança que o consumidor espera. Por meio de nota, a empresa informou que oferece mecanismos para que seus usuários se protejam de golpes na plataforma e recomenda a ativação da confirmação em duas etapas, que funciona como uma camada extra de segurança para as contas.

Leite avalia que a postura do WhatsApp leva à hiper-responsabilização do consumidor, que tem de ir atrás de informações, em vez de esses mecanismos de segurança já virem configurados como padrão. "Por que o WhatsApp notifica insistentemente as mudanças em seus termos e condições, mas não dá instruções dentro do aplicativo de como as pessoas podem evitar golpes, como a ativação da notificação em dois fatores?", ela questiona.

Em outubro, a juíza Rita de Cássia de Cerqueira, do 5o Juizado Especial Cível de Brasília (DF), condenou o Facebook – dono do WhatsApp – a pagar R$ 44 mil de danos materiais a irmãos que foram vítimas do golpe do perfil falso no Whatsapp. A juíza entendeu que a empresa permitiu que golpistas tivessem acesso a dados dos usuários e não tomou nenhuma medida para impedir os prejuízos. O Facebook ainda pode recorrer. Apesar da decisão, Simão afirma que ainda existem divergências nos entendimentos dos tribunais sobre a questão.

PIX mais seguro

Assim como os aplicativos, o Pix, que entrou em vigor em 29 de novembro de 2020, trouxe mais praticidade ao setor financeiro. Contudo, com ele surgiram novos golpes, que têm tirado o sono de muitos brasileiros, como o do perfil falso, no qual a mãe de Souza caiu, e o do código, aplicado contra Teixeira. Sem falar dos sequestros relâmpagos. Para coibir esses crimes, o Banco Central mudou algumas regras do Pix: desde o início de outubro, o limite para transferências feitas das 20h às 6h da manhã é de R$ 1 mil.

O consumidor pode pedir a ampliação do limite e cadastrar contatos que poderão receber transferências acima de R$ 1 mil. Contudo, se o banco suspeitar de golpe, pode bloquear o crédito na conta do destinatário por 30 minutos durante o dia e por uma hora à noite.

"À medida que mais e mais facilidades vão sendo colocadas nesses instrumentos de pagamento e transações financeiras, maior a necessidade de se aprofundar e conhecer quais são os dispositivos de bloqueio para garantir que a conta não seja invadida ou clonada", alerta Amorim. A economista finaliza dizendo que é importante que a regulamentação do Banco Central sobre o Pix seja mais robusta, a fim de assegurar que os brasileiros não tenham seus direitos violados.

Sofri um golpe. E agora?

Entre em contato por telefone ou redes sociais com pessoas próximas para avisar sobre o ocorrido e, assim, evitar que mais pessoas sejam afetadas;

Para recuperar sua conta, reinstale o WhatsApp. Dessa forma, qualquer indivíduo que estiver usando sua conta será desconectado automaticamente. Entretanto, caso os criminosos tenham ativado a confirmação em duas etapas primeiro, eles serão desconectados, mas você só poderá acessar a sua conta após sete dias.

Desconecte-se de outros dispositivos. Para desconectar o WhatsApp Web, acesse Configurações/Ajustes > Conta > WhatsApp Web/Desktop > Sair de todos os computadores;

 Denuncie contas não autênticas na opção "denunciar", disponível no menu do aplicativo. Também é importante enviar um e-mail para Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo. para informar sobre uma conta que esteja fazendo uso indevido de seu nome e/ou foto;

Entre em contato com a equipe de atendimento do WhatsApp pelo e-mail Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.. O texto pode ser escrito em português, o assunto pode ser "Conta clonada/roubada" e o número deve estar em formato internacional (+55 DDD XXXXX XXXX). Descreva o ocorrido com o máximo de detalhes possível no corpo do e-mail;

Entre em contato com o banco do fraudador (aquele em que o dinheiro pedido foi depositado). Só assim a conta irá para o diretório de contas suspeitas e você ajudará a evitar que outras pessoas caiam no golpe;

Registre um Boletim de Ocorrência na Polícia;

Utilize outros mecanismos de reclamação, como o Procon e a plataforma Consumidor.gov.br, para que sua queixa chegue às autoridades competentes;

Se o banco não resolver a questão amigavelmente, mova uma ação judicial no Juizado Especial Cível (JEC).


Fonte: www.idec.org.br